Por Luiz Domingues
Uma banda de Rock genuína, que consegue manter uma longevidade tão expressiva e, sobretudo, sem jamais ter apelado para atender às pressões do mercado, já merece aplausos. Mas se isso ocorre em um país como o Brasil, onde o apoio e o respeito dos grandes difusores culturais inexistem, então merece uma estátua pela extrema demonstração de resiliência ante as piores intempéries impostas pela total falta de condições para montar-se um grupo de Rock, por aqui.
É o caso do Golpe de Estado, banda que está na ativa desde 1985, e, após passar por altos e baixos e entenda-se tais fases difíceis, a ostentar entre outras dificuldades, uma perda dramática em suas fileiras, eis que o grupo dá a volta por cima em grande estilo, em torno de um belíssimo álbum duplo e ao vivo, a revisitar a sua carreira completa, sob um belo apanhado de toda a sua discografia. Com a atual e ótima formação da banda, totalmente reformulada após a perda do saudoso e querido amigo, Hélcio Aguirra, convidados para lá de especiais e dois ex-componentes, para emocionar todos os seu fãs.
Com o título bem direto a grafar: “Ao Vivo 30 Anos”, o álbum é um verdadeiro nockout, tamanha a quantidade de sucessos da banda, executados muito próximo dos arranjos originais dos álbuns de estúdio, com peso, brilho, interpretação inspirada (e emocionada em muitos momentos), e a mostrar, sobretudo, uma banda revigorada, plena em energia Rocker para seguir em frente e, assim, pronta para escrever novas histórias, que espero, sejam muitas, doravante.
CD 1:
Na Vida (LP Nem Polícia, Nem Bandido); Underground (1º LP homônimo); Noite de Balada (LP Forçando a Barra); Feira de Rato (CD Direto do Fronte); Zumbi (LP Zumbi); Paixão (LP Nem Polícia, Nem Bandido); Filho de Deus (LP Nem Polícia, Nem Bandido); Quantas Vão (LP Zumbi); Todo Mundo Tem um Lado Bicho (Bônus Track do Álbum, 10 Anos ao Vivo); Forçando a Barra (LP Forçando a Barra); Cobra Criada (LP Forçando a Barra).
Olhos de Guerra (1º LP homônimo); Caso Sério (LP Quarto Golpe); Terra de Ninguém (LP Forçando a Barra); Mal Social (LP Quarto Golpe); Velha Mistura (LP Nem Polícia, Nem Bandido); Ignoro (LP Nem Polícia, Nem Bandido); Real Valor (LP Quarto Golpe) Não é Hora (LP Nem Polícia, Nem Bandido); Solo de bateria; Onde Há Fumaça, Há Fogo (LP Nem Polícia, Nem Bandido); Libertação Feminina (1º LP Homônimo).
Portanto, como já salientara anteriormente, trata-se de um sucesso após o outro, sem chance do ouvinte e fã da banda respirar, sequer.
Sobre a sonoridade, a performance da banda mostra-se matadora do começo ao final. Mediante um áudio excelente, que garantiu não apenas a possibilidade de ouvir-se notáveis timbres de todos os instrumentos, como ao estabelecer uma simbiose entre o conceito vintage e a modernidade, visto que se os timbres belos do passado mostram-se proeminentes, ao mesmo tempo a pressão geral do CD é moderna, dentro do que há de mais atual da era digital.
Em suma, trata-se de um disco ao vivo, com um tremendo som e apenas por uma questão de gosto pessoal e não por achar uma falha, creio haver um certo excesso de reverber geral e um outro ponto que não foi o ideal, mas como músico eu entendo perfeitamente a situação da gravação ao vivo, os cortes entre as faixas ficaram um tanto quanto abruptos, mas considere o leitor que ao gravar-se ao vivo, existe uma infinidade de situações alheias ao bom andamento da gravação, a depor contra, e assim revela-se ainda mais complicado quando o artista depende de um único show para fazer a captura geral, ou seja, nessas circunstâncias, foi quase um milagre que as canções tenham sido aproveitadas sem restrições.
O normal para qualquer artista que planeja lançar um disco ao vivo, é gravar a turnê inteira e dessa forma poder escolher as faixas que irão compor o álbum, em um universo municiado por dezenas, talvez centenas de versões de cada canção, mas ao gravar um show único, realmente além da banda estar muito bem ensaiada e a contar com um performance ao vivo, brilhante e inspirada, é preciso rezar para não acontecer nenhuma falha técnica, seja do equipamento do show em si, ou do maquinário da gravação, portanto, mais um mérito para o Golpe de Estado e a equipe técnica do estúdio Orra Meu, nesta produção.
O vocalista, João Luiz, também não teve vida fácil ao assumir a responsabilidade em comandar a voz solo dessa banda, sabedor que a comparação com os vocalistas que o precederam, seria inevitável da parte da crítica e principalmente dos fãs que tendem a ser muito exigentes nesse sentido, desde que o vocalista original do grupo, Catalau, evadira-se. E assim como os demais, João comanda o vocal e com toda a galhardia de um frontman, sob nível internacional, ao abrilhantar o disco. Experiente, a ostentar uma escola oriunda do Hard-Rock, João tem uma voz muito potente, excelente presença de palco e comunicação fácil com o público e, assim, a banda está suprida para seguir em frente, com segurança.
Sobre os convidados, o tecladista, Matheus Schanoski, dispensa maiores apresentações. É aquele típico tecladista moldado pela orientação setentista, a pilotar múltiplos teclados, com muita técnica & criatividade e tudo mediante uma escolha primorosa dos timbres vintage. Portanto, para quem gosta de música bem tocada, é o tecladista certo, na hora certa.
Dois superguitarristas históricos, tocam em algumas faixas, como convidados. A lenda viva, Luiz Carlini, e o mundialmente famoso, Andreas Kisser, que são músicos de altíssima estirpe e claro que abrilhantam o álbum, com as suas respectivas participações.
O projeto gráfico do álbum merece um bom destaque. Com embalagem luxuosa e a conter um encarte rico em fotos e informações, o Golpe de Estado colocou um produto sob alto padrão à disposição de seus fãs e dignificou a história da banda.
Está de parabéns a banda e o criador do Lay-Out dessa capa/encarte/ embalagem, João Duarte (www.jduartedesign.com)
Trata-se de um ótimo álbum ao vivo, de uma grande banda com história e forte currículo, feito com esmero e a honrar não apenas as suas próprias tradições, mas o Rock brasileiro como um todo.
Por Luiz Domingues é músico e escritor.